sexta-feira, 9 de dezembro de 2005

O QUE PODEMOS APRENDER COM AS CRIANÇAS!


Ao Primeiro Ano de Vida
LEVANTE-SE DEPOIS DE CAIR
Já toda a gente observou um bebé a aprender a andar. Cai e levanta-se, cai e levanta-se... Infelizmente, apesar de podermos passar horas a vê-los, a maioria de nós não aprendeu nada com eles. Quantas vezes não desistimos de conquistar o emprego, o amor ou o croissant da nossa vida só porque chegou lá outra pessoa mais cedo, ele não sabe que nós existimos ou já não nos apetece ir às compras?

Ao segundo ano de vida
VIVA COM ENTUSIASMO
Achar graça às pequenas coisas da vida é o conselho que nos enviam dez vezes por dia naqueles e-mais piegas tipo "corrente do amor universal". Acenamos sempre que sim e quantos de nós é que dizemos "Olha que lindo, um passarinho" assim que saimos de casa de manhã e damos com um pardal a fazer arte no vidro do nosso carro? Quantos de nós somos capazes de nos entreter com um elástico? Com um rolo de papel higiénico sem papel? Com uma caixa de sapatos sem sapatos? Quantos de nós damos 18 gargalhadas por dia sem medo de nos acharem tolinhos?

Ao terceiro ano de vida
LUTE PELO QUE QUER
Para quem atura uma birra de soco e pontapé, o verdadeiro objectivo da guerra pode escapar-nos e o que é uma birra senão uma afirmação de vontade e personalidade? É verdade que nem sempre resulta para o lado deles, é verdade que não é a melhor maneira de resolver uma situação e também é verdade que muita gente continua a resolver as coisas desta maneira aos 45 anos, no entanto podemos tirar uma lição das crises de fúria dos anjinhos; é importante lutar pelo que queremos. De preferência, com métodos mais subtis, mais democráticos e um décibeis abaixo deles.

Ao quarto ano de vida
PERGUNTE QUANDO NÃO SABE
Em média, uma criança de 4 anos faz 437 perguntas por dia, segundo um estudo brasileiro. Não sabem? Fazem perguntas. Gostavam de dominar o mundo? Fazem perguntas. Gostavam de manter aquela pessoa mais tempo perto delas? Fazem perguntas (grande truque)... Em vez de andarmos assim envergonhadas pela vida fora, podiamos seguir-lhes o exemplo. Porque é que as moscas voam? Quantos dentes têm os gatos? Quanto vamos pagar de imposto? Porque é que o dinheiro parece que voa? Afinal, gostas de mim ou não? Pergunte!

Ao quinto ano de vida
FAÇA EXPERIÊNCIAS
Se puser o rato no microondas, o livro na banheira ou no prato DVD's, será que explode? Onde vai dar este caminho? Como se faz este puzzle? É verdade que são uns tiranos se os deixarem, é verdade que têm mais sede de poder do que um ditador do terceiro mundo, é verdade que querem ser bombeirossó por causa do camião vermelho ou princesas por causa da coroa e, no entanto, aprendem coisas todos os dias e fazem amigos com uma facilidade assustadora, enquanto nós... O que é que aprendemos hoje? Que caminho novo experimetámos? A quem é que "atiramos" o nosso melhor sorriso? Se disséssemos bom-dia a alguém no elevador em vez de ter aquele ar de "não estou aqui, não me estás a ver, isto é uma imagem holográfica"?

Ao sexto ano de vida
AJUDE OS OUTROS
Nunca mais se é tão angélico como aos 6 anos, nunca mais se está assim disposto a colaborar, a seguir regras, a ajudar a pôr a mesa, a tratar dos irmãos, a dar banho ao cão... Muita desta ajuda vem de gostarem de imitar o que os pais fazem. E nós, quem é que ajudámos hoje? Fizemos ouvidos moucos à colega atolada em trabalho (ela que se desenrasque), não levámos a nossa criança ao cinema (ela só gosta de desenhos animados japoneses e eu estou demasiado cansada) e não ligámos à tia Augusta (é uma santa senhora mas fica eternidades ao telefone). Aprender a partilha e a colaboração não dá assim tanto trabalho: basta querer ajudar.

Ao sétimo ano de vida
SEJA VALENTE
Há quem chame aos 7 anos uma espécie de adolescência da infância: é a idade das neuras, das zangas súbitas, a idade em que se pensa que o professor não gosta de nós e os outros meninos também não. As coisas boas de se ser criança — aprender a correr bem, aprender que sim, que o rato explode se o puserem no microondas mas é melhor não tentar, saber quantos dinossauros havia, e como e porquê aprender a ler, aprender como funcionam os relógios — já não são novidade. E acontece uma espécie de pausa: começam a perceber que é possível que aqueles que nos amam deixem de nos amar, ainda se tem medo do escuro, e do vento, e dos ladrões, e de ficar pobre, e de ficar sem amigos, e sem pais, e sem casa.. Parecem cheias de medos súbitos e sem razão, mas não há nada que meta mais medo do que enfrentar os nossos próprios fantasmas, e, no entanto, elas fazem-no...

Ao oitavo ano de vida
SINTA ANTES DE PENSAR
Vigorosos, dramáticos, curiosos, impacientes... Podem ser um cansaço, mas não há um ‘choninhas’ de 8 anos. Estão prontos para tudo: seja fazer amigos, experimentar um jogo novo, escalar o Evereste ou testar ideias novas. Todo o dia é um dia bom para a aventura. E nós? Onde está a nossa aventura? Quando nos falam em ‘aventura’, só pensamos em ter um caso num hotel de Cascais, mas nem todas as aventuras são amorosas, e mesmo essas, geralmente, ficam-se pelo sonho, a bem da paz doméstica e porque, enfim, os candidatos a aventureiros também...

Ao nono ano de vida
DEFENDA A JUSTIÇA
Cerebrais e ansiosos, esta é a idade em que tudo tem de fazer sentido. São exigentes com os outros e com eles próprios e têm uma enorme noção da justiça. Em vez de lhes dar ordens, o melhor é explicar porquê: esta já não é uma idade que aceite tudo sem mais. Faríamos bem em segui-los: quando nos querem dar ordens, podíamos perguntar porquê... Claro que dá muito menos trabalho não fazer quaisquer perguntas. Mas não é esse o exemplo que os nossos filhos nos dão.

Ao décimo ano de vida
GOSTE DE SI PRÓPRIO
Garantem os psicólogos que esta é a idade de ouro da infância, a idade em que as crianças estão de bem com o mundo e com elas próprias, em que já resolveram os medos, aprenderam a lidar com as velhas angústias e ainda não apareceram angústias novas. Claro que começam a perceber, de repente, que a infância não irá durar sempre mas isso ainda não os angustia mais do que um regresso às coisas boas daquilo que ainda não é passado... Esta é a altura em que mesmo as crianças que nunca foram de colo se abraçam ao pescoço dos pais, e dos avós, e dos tios, é a altura em que voltam a brincar com a casinha das bonecas ou com os carrinhos velhos... E nós, há quanto tempo não damos um abraço a quem quer que seja? E há quanto tempo não olhamos para um espelho e dizemos: “És mesmo gira, ó tu desse lado”?

Ao décimo primeiro ano de vida
FALE ALTO
É verdade que podem ser um bocado enervantes: não sabem como vai ser o futuro, embora intuam que vai ser qual quer coisa diferente do que eles estão à espera. Por outro lado, muita desta ‘angústia’ é provocada pelos próprios pais, pois tanto estão à espera de um adolescente maniento e irritante que se recusam a conversar com ele de igual para igual. E depois, quando eles se enervam com justa causa, a culpa é das hormonas... Se ele se revolta e quer ser ouvido, ouça-o e respeite-o. E, já agora, siga o exemplo: quantas vezes nos calamos porque é mais fácil, quantas vezes não damos a nossa opinião por medo, quantas vezes não vestimos aquela camisola cor de laranja por receio de chamar a atenção, quantas vezes não sabemos ‘vender-nos’ por medo de que nos achem convencidos?

Ao décimo segundo ano de vida
TRATE BEM OS SEUS AMIGOS
Com esta idade são todos o Kofi Annan: adoram promover a solidariedade e a igualdade. Gostam de trabalhar pelo prazer que isso lhes dá, gostam de ajudar os outros, gostam de provar que são adultos e confiáveis, gostam de defender causas e gostam de estar com os amigos. Querem ser amigos de toda a gente, é a altura daquelas intermináveis festas de anos com a turma inteira... O que podemos aprender? A olhar mais para os outros, a ligar aos nossos amigos a quem nunca ligamos, a ter uma vida própria, a ir ao cinema com a Joana e a Paula como dantes, a voltar a ter conversas parvas ao telemóvel, como dantes, como na altura em que nem sequer havia telemóvel (somos mesmo velhos...).

Ao décimo terceiro ano de vida
PONHA-SE EM CAUSA
Bem-vindos à idade mais triste da adolescência. E óbvio que cada pessoa é diferente, mas geralmente esta é a altura em que toda a gente se recorda de ter sido muitíssimo infeliz, mesmo quando se tinha uns pais fantásticos, uma casa confortável e um cão divertido. Parece que há uma crise, uma melancolia, como se se estivesse a fazer o luto definitivo da infância num só ano. E, no entanto, nem tudo é negro: este voltar-se para dentro, se for bem feito, faz com que se comece a perceber que tipo de pessoa se é, faz com que se comece a traçar um rumo de vida e a perceber que se pode sobreviver a uma crise. Há poucos adultos capazes de fazerem aquilo que as ex-crianças fazem nesta fase: pôr-se em causa, ver-se ao espelho e examinar impiedosamente cada borbulha, cada defeito, interior e exterior, e sobretudo perguntar: “Qual é o meu verdadeiro valor e como é que posso melhorar?”

Ao décimo quarto ano de vida
APRENDA A NEGOCIAR
Estão entalados entre dois mundos e a ‘velha pele’ pode ser difícil de largar. Sentem que ninguém os compreende (e a verdade é que não compreendem mesmo, porque a maioria dos adultos tem uma memória muito curti nha). Parece que ter 14 anos foi tão mau que o cérebro apagou todas os ficheiros do disco rígido. Todos lhes dizem: "Só tens 14 anos" em vez de "já tens 14 anos". Podem ser cansativos quando põem tudo em causa: e por que é que os pratos têm de estar assim na mesa, e por que é que eu tenho que chegar às 2 horas e não às 3 horas, e por que é que temos de ir todos, ao domingo, almoçar a casa da avó. Entrar em lutas de poder é inútil: não podemos obrigá-los a fazer o quer nós queremos. As vezes, eles precisam de espaço, e serem malcriados é a maneira de nos mostrarem isso. Por isso o melhor é negociar, negociar, até não poder mais: o que pode dar um bom traquejo para lidar com o chefe, o ex-marido, a sogra...

Ao décimo quinto ano de vida
MORRA DE AMOR
Nunca ninguém amou ninguém como ela ama o Tiago. Quando, de repente percebe que o Tiago, de quem gosta mesmo, é namorado da Marta, o mundo desaba. Fecha-se no quarto. Jura que nunca mais na vida irá amar alguém. Chora. Encharca a almofada. Acha que não será possível sobreviver. Só que depois o Diogo telefona... E de repente percebe que sim, que é possível sobreviver a um tal desgosto. Não entende então como foi possível amar o ‘chunga’ do Tiago (que tem borbulhas, olhos de carneiro mal-morto, zero a matemática e T-shirts sebentas). Pois o recomendável não é passar do Tiago para o Diogo e do Diogo para o Zezinho numa semana, como elas (até porque, na maioria das vezes, não temos assim tanto quórum. .), no entanto podíamos recuperar alguma dessa paixão para os nossos amores tão mornos e aprender outra vez a morrer de amor por alguém.
Revista Activa
Dezembro/2005
(Uma das coisas boas de que se
pode usufruir num salão de cabeleireiro)

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