quinta-feira, 18 de janeiro de 2007

A propósito de âncoras

A neuro-física e o princípio da ancoragem

por Mark E. Furman

A ancoragem é sem dúvida a ferramenta mais poderosa que um Practitioner de PNL tem no seu "arsenal de mudanças". Não existe uma única técnica ou procedimento usado hoje na PNL que não faça uso da ancoragem tanto explícita como implicitamente. Os princípios da ancoragem são necessários para a percepção, memória, aprendizagem, saúde, técnica de mudanças, decisões, influência e persuasão, estabilização de novos comportamentos e estados, e são totalmente indispensáveis na área da modelagem do desempenho humano.
Do ponto de vista neuro-cibernético, a ancoragem é uma das habilidades essenciais que um agente de mudanças deve possuir. Desde que essa enorme brecha no conhecimento se tornou aparente para nós, temos desenvolvido programas nos quais o principal foco é obter a habilidade e conhecer a ancoragem. A intenção deste artigo é começar a tornar explícitos os princípios e as condições cruciais para a efectividade de uma âncora.
O que são âncoras?
Âncoras são informações. Pensar nas âncoras desta maneira cria menos limitações aos modelos mentais que nós criamos, os quais influenciam o uso da ancoragem.
Âncoras podem ser pensadas como marcas sensoriais, marcadores neurológicos e pistas contextuais, gatilhos para caminhos efectivos, sinapticamente no cérebro, reacções condicionadas e mesmo como uma cola que mantém juntas as cadeias comportamentais (estratégias). Âncoras ocorrem entre cérebros e dentro dos cérebros.
Classes de âncoras
A maioria da literatura de PNL que eu examinei fala apenas sobre um tipo de ancoragem. Na PNL, nós falamos predominantemente sobre a ancoragem de estados fisiológicos. Nenhuma literatura que eu já examinei, nem mesmo sugere o facto de que você pode ancorar comportamentos tanto abertamente como não. No caso da ancoragem dos estados fisiológicos, é usado predominantemente um tipo de âncora para marcar neurologicamente um estado que você quer re-experimentar à vontade ou usar como um recurso num contexto específico tipo ponte ao futuro. Eu me refiro a esse tipo de ancoragem como "ancoragem de sinal".
Ancoragem sinal
Essa é uma âncora que actua como a condição inicial necessária para colocar o estado vector do cérebro numa trajectória para o estado fisiológico desejado. Pensar em âncoras somente deste modo, impõe limitações rigorosas na flexibilidade que a ancoragem poderia fornecer de outra maneira. Outra limitação comum é que a ancoragem é ensinada e utilizada explicitamente através do sistema cinestésico/táctil usando somente uma das miríades dos sistemas sensoriais possíveis que existem tanto externa como internamente no sistema nervoso humano. Ainda que as âncoras visuais e auditivas sejam usadas implicitamente, os princípios e as condições para o seu correcto desenvolvimento ainda não foram expostas de uma forma que possa ser ensinada e reproduzida. Eu acredito que isso cria uma grande desvantagem na jornada dos Practitioners de PNL para entender a mudança.
Também descobri que a falta de conhecimento e habilidade nessa área literalmente deixa mutilado o processo de modelagem do desempenho humano. Qual a vantagem de capturar e codificar a excelência na forma de crenças, valores, estratégias, meta-programas, sub-modalidades, etc., a não ser que você possa efectivamente "instalá-las" em você ou noutro ser humano?
Muitas pessoas no mundo parecem tremer só de pensar em fazer uma simples mudança como perder peso, parar de fumar, etc. A instalação de mesmo um simples modelo de excelência humana pode exigir cerca de 100 mudanças neurológicas, considerando todas as crenças, valores, meta-programas, estratégias que devem ser mudadas a fim de que o modelo funcione inconsciente e permanentemente. Sem um conhecimento profundo dos princípios e condições necessárias para a efectiva ancoragem, como é que tal tarefa assustadora pode ser abordada? Não é de admirar porque é que as pessoas fazem mudanças que não são mantidas.
Apesar de que o domínio desses princípios somente pode ser adquirido dentro de um razoável período de tempo através de workshops experimentais, nós achamos necessário expor um enquadramento básico escrito com a intenção de fornecer alguma preparação para os Practitioners de PNL curiosos. A âncora de sinal é uma das duas principais classes de âncoras. A outra é a âncora de confirmação/reforço. Vamos examinar primeiro as várias classes de âncoras de sinal.
Âncoras de aparência
Âncoras de aparência podem ser consideradas como qualquer conjunto de condições iniciais que podem ser percebidas por qualquer um dos sistemas sensoriais internos ou externos do cérebro humano. Em resumo, qualquer agente que pode ser completamente diferenciado por um receptor sensorial pode actuar como uma âncora de aparência. A âncora de aparência é a única classe principal de âncora que é tratada explicitamente nos treinos de PNL. Em todos os casos, é a aparência de algum objecto, um som ou toque nos receptores do sistema sensorial que dispara o acesso a um particular estado fisiológico ou estado. Essa descrição possui enormes limitações como você verá em breve.
É importante notar que existem muito mais do que cinco sistemas sensoriais capazes de responder às âncoras de aparência. Um deles é o sentido próprioceptivo que acompanha a posição e a velocidade dos membros no espaço. Outro é o sistema vestibular que acompanha o balanço e a posição do corpo em relação a gravidade. E isso é somente a ponta do iceberg!
Âncoras de desaparecimento
Uma classe inteira de âncoras quase tão vasta e versátil como as de aparência são as âncoras de desaparecimento. Âncoras de desaparecimento ocorrem em todos os lugares da vida mas raramente são vistas como âncoras. E como tal, tornam-se um método de ancoragem ilusório e oculto.
Um exemplo de uma âncora de desaparecimento ocorre quando uma esposa diz ao marido "Quando você está aqui, eu me sinto como se pudesse conquistar o mundo, mas logo que você sai, eu fico profundamente deprimida". Nesse caso a condição inicial de conduzir para a depressão não é um objecto que pode ser visto, nem som nem toque, senão o desaparecimento de uma coisa possível ou de todas estas coisas.
Outro exemplo disso é o estado que você entra quando ouve a porta do seu carro bater com força atrás de você, você olha para a sua mão e nota que as chaves do carro não estão lá. Aqui de novo, não é apenas o som da porta que é a condição inicial para conduzir para este estado fisiológico de pânico. As condições iniciais necessárias para entrar neste estado são totalmente dependentes do som mais o desaparecimento das chaves do lugar que deveriam estar – na sua mão.
Esse tipo particular de âncora é também apresentado como âncora complexa ou composta. Essa âncora composta exige que as duas condições sejam satisfeitas a fim de disparar o estado de pânico. A primeira condição é a aparência auditiva do som da porta batendo atrás de você. A segunda é o desaparecimento visual das chaves do lugar que deveriam estar – na sua mão.
Âncoras de traço
A âncora de traço é possível quando um estado é muito forte. A força do estímulo cria uma oscilação contínua dentro do sistema nervoso. Essa trajectória sustentada pode tornar-se a condição inicial para disparar um estado fisiológico específico ou comportamento. Uma das maneiras de perceber se o estímulo ou o traço do estímulo é de facto a âncora, passa por acompanhar o período de tempo entre o forte estímulo e a reacção. Se a demora é longa, então o traço é a condição inicial necessária. Se a demora é curta, então é o próprio estímulo forte a condição inicial. As âncoras de traço são algumas vezes chamadas de âncoras de pausa ou de demora.
Âncoras de intervalo de tempo
O gânglio básico do cérebro humano coordena muitas funções ao sequenciar a actividade motora sensorial. Ele também tem a função pela qual o cérebro pode acompanhar os intervalos de tempo. A dopamina é utilizada por esse circuito complexo da mesma maneira que a areia é utilizada nas ampulhetas. Como resultado dessa precisa função do cérebro, o próprio tempo pode ser usado como uma âncora para qualquer estado fisiológico ou comportamento desejado. Um exemplo subtil disso na vida diária é a experiência de acertar o alarme do relógio para as 7:00 horas da manhã e você descobrir que já está bem acordado às 6:59. Nesse caso, o próprio intervalo de tempo foi o responsável pela mudança da dominância neuro-biológica na base do cérebro da actividade colinérgica para aminérgica, desta maneira ocorrendo uma transição no cérebro do estado adormecido para acordado (a mais fundamental de todas as transições fisiológicas do estado cerebral).
Um outro exemplo ocorre no nosso dia a dia quando você se dá conta de que o seu estômago pede comida, todos os dias, no mesmo horário. Nesse caso, o próprio intervalo de tempo dispara as moléculas mensageiras do sistema digestivo que resulta na sua sensação de fome e não um estímulo externo como o cheiro de comida, o jingle do Mc Donalds ou a visão de um hambúrguer.
Âncoras complexas/compostas
Como observamos nos exemplos anteriores, as âncoras compostas utilizam ou mais do que um receptor do sistema sensorial e/ou mais do que uma classe de âncoras. Uma das razões mais importantes para a utilização de âncoras compostas é o manter a singularidade das condições iniciais pois assim o sistema nervoso pode facilmente diferenciar entre sinais que ordenam estados ou comportamentos específicos. Quanto maior a diferença, maior será o número de estados colectivos possíveis que podem ser disparados à vontade.
A utilização das âncoras compostas permite-nos ter uma flexibilidade muito maior. Outra vantagem da utilização das âncoras compostas é que quando você utiliza especificamente um sistema sensorial, você elimina a interferência incontrolável que pode ter ocorrido neste sistema sensorial que poderia enfraquecer a precisão da sua âncora.
Um exemplo de âncora de sinal composta, que ocorre naturalmente no dia a dia, poderia ser o som da voz de alguém combinado com a expressão do seu rosto que acompanha as suas palavras. Existem muitos estados fisiológicos que podem ser somente disparados pela combinação da expressão facial e um certo tom de voz. Nós chegamos a presumir que essas duas coisas ocorram juntas.
Os comediantes são hábeis em fazer uso desse fenómeno ao combinarem a expressão facial com um certo tom de voz, ou vice versa, resultando numa gargalhada estrondosa da audiência. O estado do cérebro é imediatamente enviado para a fase de transição que fica oscilando entre os dois estados fisiológicos incompatíveis especificados pelo tom de voz e pela expressão. Isso resulta numa perplexidade moderada e risadas.
Como mencionado antes, as âncoras compostas ou complexas podem existir entre os circuitos codificados do sistema sensorial bem como entre as diferentes classes de âncoras. Qualquer combinação de âncoras (aparência, desaparecimento, traço ou de intervalo de tempo) pode ser considerada uma âncora complexa ou composta que causa uma grande versatilidade e uma forma de arte.
Âncoras de variação
Âncoras de variação dependem das sub-modalidades. Essa é outra fonte muito rica de âncoras. A âncora de variação é qualquer agente interno ou externo que pode ser escalado analogicamente como o brilho, a velocidade, o tamanho, o volume, a temperatura, etc. Dentro da âncora de variação, a variação do próprio estímulo ou a obtenção de um ponto inicial especifico, pode disparar um estado fisiológico ou comportamento,
Âncoras do ponto inicial são uma subespécie das âncoras de variação. Nós temos todos os estados fisiológicos e comportamentos experimentados que eram dependentes do ponto inicial. Um exemplo comum da âncora de variação é a luminescência de um quarto. Quando nós fazemos variar a luz de um quarto desde o muito claro para algo próximo a luz de vela, nós podemos tornar-nos muito românticos. Desta maneira, tanto a própria variação como o ponto inicial é considerado pelo sistema nervoso como a condição inicial que conduz a um estado fisiológico de sentimento romântico. Âncoras de variação ou do ponto inicial são também muito evidentes na parte do sistema nervoso que transmite as mensagens de dor.
Grau de mudança / âncoras de aceleração
Uma âncora de aceleração é uma subclasse das âncoras de variação. Nesse caso, o acesso aos estados fisiológicos é dependente do grau de mudança de um agente, não a sua velocidade. Uma pessoa que caminha numa rua sossegada pode estar num estado quando o som dos passos atrás de si combina com o seu próprio som, e num estado completamente diferente quando aqueles passos continuam a acelerar em relação aos seus próprios. Nesse caso, os passos podem ter disparado um estado específico mas o comportamento para correr é disparado pela aceleração do som dos passos em relação aos seus próprios.
Âncoras de inibição
As âncoras de inibição são uma classe de âncoras cuja actividade neural interfere com aquelas da âncora de sinal. As âncoras de inibição podem ser externas ou internas. Para criar uma âncora de inibição externa, nós podemos ancorar um estado incompatível ou utilizar um estímulo particularmente forte e, desse modo, é possível inibir ou fazer colapsar/cair o estado determinado pela âncora de sinal.
Uma âncora de inibição interna é criada quando uma âncora de sinal não conduz a uma reacção previamente ligada e pode ser utilizada pelo prosseguimento do disparo da âncora de sinal. Nesse caso, a própria âncora de sinal torna-se a âncora de inibição. Todas as outras âncoras discutidas até aqui, são consideradas excitantes.
Âncoras embutidas
Uma âncora embutida é uma âncora de sinal que dispara um estado ou comportamento pelo comando linguístico embutido. Esse tipo de estrutura da ancoragem é muito útil em situações que exijam âncoras ocultas e influência não detectável.
Explicando de uma maneira simples, uma âncora embutida nunca é reconhecida conscientemente pelo cérebro e pode ser fixada a uma âncora de sinal que consistentemente dispara a sua execução. A última classe de âncoras que nós vamos examinar são chamadas as âncoras de confirmação ou reforço.
Âncoras de confirmação/reforço
As âncoras de confirmação diferem das âncoras de sinal visto que elas não estabelecem o estado vector da trajectória para um estado específico ou comportamento. Ao contrário, elas confirmam ou reforçam um estado ou comportamento específico e aumentam a possibilidade de recorrência. Ao nível molecular, as âncoras de confirmação são âncoras que utilizam a dopamina do sistema de recompensa do cérebro para aumentar a probabilidade de que uma reunião particular de células nervosas irá ser reforçada e recorrer. O timing é o factor crítico que diferencia a função de um estímulo específico no sistema nervoso. Se o estímulo começa antes e se sobrepõe a um dado estado ou comportamento, é uma âncora de sinal. Se o estímulo ocorre somente durante o estado ou comportamento, é uma âncora de confirmação ou reforço. O estímulo deve começar e terminar muito rapidamente e deixar pouco ou nenhum traço fisiológico a fim de efectivamente assinalar um estado ou comportamento para a re-recorrência.
Princípios e condições
Existem cinco princípios básicos e condições para o estabelecimento efectivo de uma âncora. Eles são os seguintes:
Imparcialidade do estímulo. A fim de ser efectivo, o estímulo que você deseja transformar numa âncora não deve determinar já um estado ou comportamento particular. Se ele o faz, irá se tornar uma âncora de inibição e não uma âncora de sinal.
Saúde. A saúde do cérebro é crítica na formação da força sináptica dependente da actividade. Os padrões dependentes da actividade das conexões neuronais estão baseados na formação de todos os estados fisiológicos e comportamentos. Se o estado do cérebro ou do corpo não estiver de saúde boa, isso vai exigir muito mais repetições da introdução do estímulo para criar uma ligação efectiva e duradoura.
Livre de interferência. Estímulo estranho é qualquer estímulo não controlado por si, que pode e irá interferir com o acesso preciso e consistente ao estado ou comportamento desejado. Âncoras complexas ou compostas que utilizam algum ou todos os nossos circuitos codificados do sistema sensorial irão eliminar substancialmente essa interferência.
Estado do cérebro. Menos repetições serão exigidas para combinar os estímulos com o estado ou comportamento quando o estado do cérebro está alerta. O uso das âncoras de confirmação ou reforço aumenta a vigilância ao criar um estado de reaferência (aumento do fluxo sanguíneo para os antigos córtices sensoriais do cérebro resultando numa combinação mais rápida e precisa).
Timing. Como examinamos antes, um estímulo que começa antes e se sobrepõe a um estado ou comportamento particular, transforma-se numa âncora de sinal. Um estímulo que ocorre apenas durante um estado ou comportamento específico é transformado numa âncora de confirmação ou reforço. Este reforço pode ser pré-determinado como positivo (aumentando a probabilidade da re-recorrência) ou negativo (diminuindo a probabilidade da re-recorrência).
Infelizmente, o escopo deste artigo só nos permite uma discussão preliminar da vasta ciência e forma da arte de ancoragem. Até agora, nós somente mostramos algumas das mais importantes classes de âncoras bem como alguns princípios básicos e condições. O domínio dessa habilidade também deve levar em conta os procedimentos como transferência, enfraquecimento, colapso, empilhamento, encadeamento (estados e comportamentos), só para citar alguns.
Cada um desses procedimentos tem um exclusivo conjunto de princípios e condições que afectam o resultado neurofisiológico. Tanto a neurofísica como a neurofisiologia tem lançado luz em milhares de novas maneiras nas quais essas classes de âncoras podem ser usadas para pôr em movimento as mudanças e facilitar a modelagem do desempenho humano. Obviamente, o domínio dessas habilidades exige que os Practitioners tenham representações sensoriais de como se parece, como ela soa e como se toca cada classe da correcta ancoragem. Em muitos casos isso poderá ser obtido através de workshops experimentais e demonstrações ao vivo.

As âncoras podem ser usadas para eliminar traumas, melhorar a memória e o aprendizado, manter a saúde, facilitar a mudanças, influenciar e persuadir, instalar modelos de excelência humana e muito mais.
Artigo publicado na revista Anchor Point de junho de 1996.
http://www.golfinho.com.br/artigos/mente_e_cerebro/mente_e_cerebro_6.htm

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